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Reflexão sobre IAs generativas, pt2

  • Foto do escritor: Paulo Fabre
    Paulo Fabre
  • 27 de mai.
  • 2 min de leitura

Fim de dia no Lago Espolón, em Futaleufu, Patagônia chilena. Imagem arquivo @paulofabre
Fim de dia no Lago Espolón, em Futaleufu, Patagônia chilena. Imagem arquivo @paulofabre

Quando criança, eu gostava de olhar uma coleção de livros com fotografias de natureza ao redor do mundo. Tinha um sobre a floresta amazônica, outro sobre o deserto na Mongólia, os Himalaias. Era fascinado por aquelas imagens e ficava sonhando com uma aventura inóspita por paisagens vastas e encantadoras, criando cenários imaginários para as minhas brincadeiras de menino.

Corta para 2025!

Estava num restaurante com minha família onde, numa tela ultranítida e brilhante, um conjunto de imagens hiper-realistas se revezava em looping. Minhas filhas, de 6 e 9 anos, um tanto entediadas aguardando a comida chegar, duvidavam daquelas paisagens pretensiosamente bucólicas:

— "Aquela até parece de verdade, papai, mas acho que não é!"

— "Essa, com certeza, é inteligência artificial."


Um misto de surpresa e decepção surgiu em mim. Primeiro, fiquei feliz por elas já possuírem um senso crítico aguçado em relação àquilo que veem. Pois não seria justamente o desenvolvimento dessa leitura e percepção, rápida e afiada, um dos itens essenciais para transitar rumo à segunda metade do século XXI? Mas depois, ao lado da constatação, veio uma decepção cinzenta: para essas crianças, as imagens suscitam mais dúvidas do que encantamento. Ainda na primeira infância, já estão saturadas delas — já viram muito mais do que seus olhinhos dão conta. Nem aprenderam a ver e já desenvolveram um mecanismo de defesa, esquivando-se do bombardeio visual que as aguarda no mundo das redes (não antes dos 16 anos, aqui neste lar).

Como cuidadores, nos preocupamos com o que nossas crianças absorvem — seja pela boca, pelos olhos ou ouvidos — e colocamos limites para evitar excessos, além de procurarmos sempre ser os melhores exemplos. Mas elas fazem parte de um mundo perplexo com as possibilidades da inteligência artificial e estão crescendo em meio às novas tecnologias e ao esforço, cada vez maior, de mantê-las sob o controle de seres humanos.

Permito-me refletir e fazer uma inflexão sobre o assunto: será que precisamos, realmente, de tantas imagens assim? De onde vem o impulso de pegar qualquer coisa que passa pela cabeça, transcrevê-la num prompt e gerar um quadro visual? Vale a pena gastar tantos litros de água só para entrar em um trend e postar um meme que se extinguirá na flipada seguinte? Tenho visto cada coisa nas redes sociais — imagens que existem apenas pela simples razão de que poderiam ter sido feitas, sem muito esforço nem dedicação.

Já passamos uma parte considerável do nosso dia diante de telas, consumindo imagens sem nos darmos conta do que elas nos dizem, pulando de notícias para vídeos fofos, com nossa atenção e capacidade de concentração cada vez mais fragmentadas. Ao mesmo tempo, estamos ficando cada vez mais insensíveis, anestesiados pelo excesso, incapazes de nos comover com uma paisagem bonita, tampouco com o testemunho documental das tragédias cada vez mais frequentes.


Insisto na fotografia como gesto atento e de escuta. Não para competir com a velocidade das máquinas ou com a infinita produção de imagens automáticas, mas para olhar o mundo com mais profundidade, sentir sua presença e, quem sabe, despertar no outro o mesmo encantamento que me tomava quando criança, diante de um livro de imagens aberto sobre a mesa.


 
 
 

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