Enquanto me preparava para entrar na sala de parto, tomei a decisão consciente de deixar a câmera trancada no vestiário e não fotografar o que viria a seguir. Não queria nada entre mim e a emoção que me aguardava.
Pode parecer contraditório um fotógrafo desistir de registrar um momento tão importante quanto esse, mas para mim foi justamente o oposto. A câmera tem o poder de capturar o presente e eterniza-lo, mas cobra um preço por vezes alto de quem a dispara. O ato de fotografar é um ato de criação, de manifestação da vontade do fotógrafo, amador ou profissional, que deixa de ser espectador e passa a construir uma imagem da realidade. Nesse momento ele abre mão de contemplar e parte para um outro lugar temporal onde a fotografia é maior que o momento em si. Na maioria das vezes, esta é a intensão.
Porém, nos momentos mais importantes da nossa vida, naqueles aonde nada mais importa além do que está acontecendo, fotografar pode diminuir o valor da experiência. Primeiro, a imagem jamais terá a mesma emoção e sentimento. Mesmo que você diga que a fotografia servirá para lembrar daqui a 30 anos, prefiro ter vivido 100% daquela emoção e ter uma lembrança menos nítida do que abrir mão da experiência completa para ter um registro cheio de lacunas. Aliás, nosso cérebro armazena memórias atreladas a sentimentos, então é capaz da minha lembrança daquele dia manter-se viva por muito tempo.
Depois, como hoje em dia a fotografia não acaba em si, ainda é preciso postar, o camarada abre mão de segundos preciosos para compartilhar um registro isolado e, quando volta à consciência do presente, muita coisa já passou (e não voltará).
Por fim, eu quis compartilhar esta experiência como uma reflexão sobre estar presente por inteiro, pois a beleza de certos momentos efêmeros é muito maior do que a câmera pode registrar. As fotos mais bonitas que já fiz foram aquelas em que decidi não clicar.
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